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Brasil: um atraso em termos de conteúdo digital


Para a Apple, o dia 16 de novembro de 2010 seria um acontecimento que os fãs da marca jamais esqueceriam. Foi nesta data que todo o acervo dos The Beatles, uma das maiores bandas do século XX, chegou à iTunes Store e se tornou disponível para todos de forma digital. O anúncio, porém, não foi muito bem recebido pela maioria dos fanáticos pela empresa.
A novidade, entretanto, tem um significado muito maior para a Maçã. Devido às disputas na justiça devido à marca (a empresa de Jobs compartilha seu nome com a gravadora dos Beatles), a banda de Liverpool era uma das poucas a ainda ter seu catálogo disponibilizado apenas em meios físicos, como CDs e DVDs. A notícia marca em definitivo a vitória da iTunes Store sobre a distribuição tradicional, e indica um futuro de mídia exclusivamente digital.
Todo esse mundo de conteúdo, porém, não está disponível para os brasileiros, que se limitam apenas em assistir ao barco passando de longe e ficam na esperança de que um dia serviços deste tipo cheguem com força por aqui. Há muitas razões para o atraso do Brasil neste quesito, mas elas basicamente giram em torno de dois pontos principais: leis e licenciamento.

App Store limitada

Barras da iTunes Store americana e brasileira
As barras superiores das lojas americana e brasileira. Você consegue dizer qual é qual?
A diferença entre as lojas da Apple brasileira e americana é percebida logo na página inicial. Enquanto nos EUA os principais destaques vão para as músicas mais vendidas e filmes mais assistidos, na brasileira a home é tomada por aplicativos de produtividade e outros muito pouco interessantes.
Apesar de músicas e filmes não estarem disponíveis, o que realmente deixa os usuários de gadgets da Apple frustrados é a ausência de games na loja nacional. A vilã desta situação é uma só: a atual legislação com relação à classificação indicativa desse tipo de conteúdo em nosso país.
Não tem como disfarçar a frustração
Uma portaria publicada pelo Ministério da Justiça em 14 de junho de 2006 torna o órgão único responsável pela classificação de filmes e jogos eletrônicos. Como o sistema usado em nosso país é diferente do americano, a indicação dos EUA não vale por aqui e a análise teria que ser feita novamente. Devido à grande quantidade de games para serem avaliados, isso levaria algum tempo.
Este processo, porém, vai contra os princípios da App Store, que é sempre levar o menor tempo possível para aprovar um aplicativo. Muitas vezes, softwares são submetidos à avaliação e publicados na loja no mesmo dia. Esta é a explicação oficial da Apple para a ausência de jogos na loja brasileira.

Nos consoles, o mesmo problema

No início de novembro, a chegada da Xbox LIVE ao Brasil foi muito comemorada pelos fãs de games. Agora, a rede online do console da Microsoft poderia ser usada oficialmente no país, com preços em reais e conteúdo totalmente em português. Na teoria, a ideia é belíssima. Na prática, não funciona bem assim. E a vilã, mais uma vez, é a classificação indicativa.
O conteúdo de jogos digitais é praticamente inexistente. Apesar de possuir uma biblioteca considerável de demos e conteúdos extras, todos os títulos são games já disponíveis oficialmente no Brasil, ou seja, já avaliados pelo Ministério da Justiça. Por isso, muitos gamers ainda preferem utilizar o serviço americano, mas enfrentam um sério problema na hora das compras: a LIVE não aceita cartões de crédito brasileiros.
Xbox LIVE e Playstation Network
Fonte das imagens: Divulgação / Microsoft e Sony
Os problemas também acontecem na Playstation Network, rede do console rival. Por lá, é possível criar uma conta brasileira, mas ela não dá acesso à loja virtual nem a outros serviços disponibilizados pela Sony. Comprar jogos então, nem pensar. Com isso, a quantidade de brasileiros com contas nacionais é nula, e a maioria dos nossos conterrâneos prefere criar perfis americanos.
O problema com o cartão de crédito, porém, persiste. A Sony exige cartões com endereços nos EUA para a realização de compras e os usuários, em sua maioria, apelam para métodos alternativos ou ficam apenas assistindo de longe ao mundo de conteúdo disponibilizado. Apesar de rumores constantes, a Sony afirma não ter planos de trazer a PSN ao Brasil em um futuro próximo.
Tela da loja online do Wii
Fonte da imagem: Divulgação / Nintendo
Neste quesito, a vantagem ainda está com o Nintendo Wii, que permite a compra de conteúdo digital por cartões de crédito brasileiros e não limita a criação de perfis ao país no qual o usuário mora. A rede online do console, porém, é considerada a pior das três e não possui opções intuitivas para jogabilidade online e relacionamento entre amigos.

Engatinhando em filmes digitais

O serviço Saraiva Digital, lançado pela rede de livrarias de mesmo nome, foi lançado em 2009 com a promessa de liderar a oferta de filmes pela internet e oferecer títulos com preços cerca de 15% menores que o de DVDs. Mais de um ano após o início das operações, porém, a iniciativa ainda engatinha e não deu origem a uma tendência no país.
O principal motivo para isso são os preços. Enquanto o aluguel de um filme, que pode ser assistido por períodos entre 24 horas e três dias de acordo com a categoria, sai em média por R$ 6,90, a compra de um arquivo digital pode custar até R$ 35, preço equivalente ou até maior que a versão em disco físico. A resolução, porém, não chega à alta definição e os filmes normalmente têm tamanho de 720 x 480 pixels e som stereo.
Outro entrave é a velocidade das conexões nacionais, já que os títulos disponibilizados pela Saraiva normalmente ultrapassam 1 GB. Apesar de possuir opções de pausa e interrupção de downloads, ainda assim os usuários precisam esperar pelo menos algumas horas para assistir aos filmes alugados.
Nos EUA, porém, a realidade é outra. Lojas virtuais como a iTunes, por exemplo, disponibilizam títulos digitais no mesmo dia de lançamento de versões físicas e apresentam preços mais adequados ao conteúdo ofertado. O aluguel de filmes recém-lançados sai a partir de US$ 0,99 (cerca de R$ 1,70), enquanto a compra custa US$ 14,99 (pouco mais de R$ 25), preços normalmente abaixo do custo de um disco físico.
Tela de venda ou aluguel de Scott Pilgrim Contra o Mundo
A líder desse tipo de serviço nos Estados Unidos é a Netflix, que também oferece locação de DVDs e Blu-rays com entrega e retirada em residência. A empresa se destaca pela variedade de aparelhos em que pode ser utilizada. A lista vai de dispositivos portáteis como celulares e tablets até video games. Tudo isso, claro, não está disponível no Brasil.
Hulu.com é destino certo para quem curte seriados. O site disponibiliza, gratuitamente, episódios das séries horas depois da exibição na TV para serem assistidos via streaming. Apesar de não contar com vídeos em alta resolução, o serviço já foi responsável pelo cancelamento de muitas assinaturas de TV a cabo nos Estados Unidos.
O conteúdo do Hulo não está disponível no Brasil
Por questões de licenciamento, o serviço não está disponível por aqui. A razão são os direitos autorais, que normalmente pertencem às emissoras que transmitem os episódios no Brasil. Como estas empresas constantemente travam guerra contra o download de seriados, não dá para esperar que elas negociem com um serviço de streaming online tão cedo.
A mesma lógica vale para a ausência da iTunes Store e Netfilx neste segmento no Brasil. Os acordos de licenciamento são complicados, e exigem grandes negociações e milhares de dólares em investimento. Por enquanto, o retorno financeiro destas iniciativas ainda não é garantido por aqui.

Ouvindo (algumas) músicas

Pandora Radio é responsável pela descoberta de novos artistas por muitos americanos. Com um sistema baseado em recomendações de acordo com os gostos musicais do usuário, o site é um dos maiores provedores de áudio em streaming do mundo. Devido às mesmas questões de licenciamento de faixas, não está disponível no Brasil.
Na mesma categoria está o Last.FM, que funciona basicamente da mesma forma mas também é capaz de registrar as faixas reproduzidas pelo PC do usuário. O serviço estava disponível gratuitamente a todos os brasileiros até julho de 2008, quando o acesso às rádios de recomendações foi restringido, de forma gratuita, aos usuários dos EUA, Reino Unido e Alemanha.
Nos usuários brasileiros está disponível o Grooveshark, que esbarra na ilegalidade ao disponibilizar faixas que são carregadas ao site pelo próprio usuário. Há também as rádios online, como as disponibilizadas pelo UOLTerra ou GVT.
Se depender da venda de músicas no Brasil, o iPod vai ficar vazio
Se a oferta de rádios streaming para brasileiros não é adequada, o que falar sobre os serviços de venda de músicas individuais? São poucos os sites que vendem faixas desta forma, e os preços normalmente são bem salgados.
Enquanto uma faixa recém-lançada sai por US$ 0,99 (cerca de R$ 1,70) na iTunes Store, a UOL Megastore oferece a mesma música por R$ 1,99. Enquanto os preços são parecidos para arquivos individuais, álbuns completos chegam a ser até mais caros que a versão em disco, inviabilizando a compra por este tipo de serviço.

O jeitinho brasileiro

Apesar de todas essas dificuldades, era de se esperar que o brasileiro usasse o famoso “jeitinho” para ter acesso a conteúdo de qualidade a preços justos. E não estamos falando de pirataria nem métodos ilegais, é possível aproveitar tudo que as redes citadas neste artigo têm para oferecer e pagar devidamente por isso.
Gift cards da PSN e Xbox LIVE
Para as redes dos consoles, uma das principais opções é a compra de gift cards. Basicamente, são cartões-presentes como os disponíveis em livrarias e megastores, que permite até um certo valor. Os gift cards podem ser comprados com certa facilidade em sites como Mercado Livre e Maximus Cards, apenas para citar dois exemplos.
Para comprar na iTunes Store, muitos usuários se cadastram na versão argentina do serviço. Lá, a grande maioria dos jogos para iPhone e iPad estão disponíveis, com preços em dólar que podem ser pagos com cartão de crédito brasileiro.
Servidores proxies podem ser utilizados para burlar a restrição de região existente em sites de música ou vídeos. Ao transformar o endereço IP, que identifica seu computador, em um número americano ou europeu, este tipo de aplicativo engana o servidor dos serviços e permite acesso ao conteúdo.
Screenshot do aplicativo Surf Anonymous Free
Alguns programas deste tipo estão disponíveis no Baixaki, como o Surf Anonymous Free. O lado negativo é que muitos destes serviços deixam a conexão mais devagar e, com isso, podem impossibilitar a utilização de streamings ou downloads.

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